sexta-feira, 9 de maio de 2008

Sobre o outono e o dia das mães

“Abra os olhos! As ‘patas-de-vaca’ estão maravilhosamente floridas, espalhadas pela cidade. Parecem-se com orquídeas. Orquídeas de pobre: abundantes e grátis. E veja os ipês brancos, delicadíssimos, antes que sua floração efêmera acabe. Também estão florescendo as quaresmeiras.” (Rubem Alves, Correio Popular, 2001)


Nestes dias de outono, quando finalmente faz frio de outono e manhãs de outono, numa visita ao site do escritor Rubens Alves (www.rubemsalves.com.br), caiu sobre meu teclado o trecho acima. Como na música de Milton, “Certas Canções”, às vezes eu me pergunto “como não foi eu quem fiz.”

Em minhas caminhadas, essas árvores fazem parte da paisagem. Espalhadas em nossa cidade, pelas ruas do Tangerinal, pelas transversais das Ruas 31 e 33, pelo Aterrado, por Niterói, as patas-de-vaca são brancas, rosas e lilases. Bem provável de relacionar todos os bairros da cidade. Eu não sabia o nome da flor e por muito tempo fiquei pensando como poderiam dar orquídeas em árvores assim. Quem me ensinou o nome foi minha mãe.
Os ipês, bem mais conhecidos, floridos junto com as quaresmeiras, são fáceis de se ver no bosque do Laranjal, aquele que fica na subida para o Monte Castelo. As paineiras com sua floração rósea parecem fazer pose para a foto.
Recentemente, descobri um ipê branco, sozinho numa rua escondida. Tive o prazer de contar à minha mãe sobre ele. Ainda não consegui levá-la para vê-lo. Fica na Visconde de Taunay, aquela subindo da São João para o colégio, na esquina com a Toledo Piza. Na calçada de uma casa simples, comprido, fino, e que floresce raramente. Ou de floração efêmera, como disse nosso cronista. Não sei se existe outro na cidade. Merece registro e foto.

Minhas memórias são da cidade, em torno dela, mesmo quando viajando em outras cidades, é nela que penso, é para ela que volto. Não sei se ela me aceitou como filha. Talvez eu a tenha adotado como mãe. As memórias de minha mãe, a Ignez, são divididas entre a fazenda, a roça, o interior e as cidades que viveu. Santos Dumont, Rio de Janeiro, Volta Redonda, Porto Alegre, Volta Redonda. Vila Velha, Volta Redonda.

As manhãs de outono me fazem lembrar de um tempo que minha mãe sentava ao sol, no quintal, catando feijão ou arroz, e eu ficava ao seu redor, para aproveitar do calor dos dois. Às vezes, fazia tricô ou crochê. No meio das flores de outono, penso no presente que posso compartilhar com minha filha, para não sofrer com o futuro que ela venha a ter. Suas asas estão crescendo e em breve seu vôo será para longe.

Entre chaminés e asfalto, espero que meu ninho não se desmanche com o vento e a chuva. A cidade que é mãe precisa abrigar mais filhos. A filha de outra cidade ainda tem muito que trilhar. Necessário se faz conhecer cidadãos e histórias. Por isso, é muito bom dizer para minha mãe, a Ignez, que a amo. É muito bom dizer para a minha mãe, a cidade, que aprendi a amá-la. É maravilhoso ouvir de minha filha que ela também me ama. É muito bom sentir através de meus filhos, os poemas e as crônicas, o amor se espalhando.

regina vilarinhos - crônica publicada no "Diário do Vale", em maio de 2006.

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